Se uma proposição no futuro é verdadeira, isso significa que está determinada? Como fica o livre arbítrio?
Se afirmo que “Fulano estará no Rio de Janeiro no Natal”, segundo a lógica clássica, essa proposição deve ser Verdadeira ou Falsa. Em sendo verdadeira, isso significa que estou determinando, sem escolha, que Fulano viaje até o Rio de Janeiro no Natal? Se for falsa, significa que é impossível que Fulano vá até o Rio de Janeiro no Natal?
Lógicas polivalentes
Vejamos que, segundo a lógica clássica, se afirmo a verdade da proposição “Fulano estará no Rio de Janeiro para o Natal”, ela não pode ser falsa. Então, a crítica, que começa no próprio Aristóteles, é que esse raciocínio é determinístico, ou seja, determina que tal evento deve obrigatoriamente ocorrer, ou teríamos que dizer que a proposição é falsa.
Como não podemos prever o futuro, o correto seria afirmar “Fulano estará ou não estará no Rio de Janeiro para o Natal.”. É uma sentença perfeitamente válida, mas não é útil. Esse pequeno problema, trouxe a necessidade de ampliar a lógica clássica.
Jan Łukasiewicz (1878-1956) pensou sobre essas implicações lógicas, e propôs um novo valor para as proposições: Indeterminado. Por ter três valores possíveis: Verdadeiro (1), Falso(0) e Indeterminado (1/2), sua lógica foi chamada trivalente.
A afirmação de que “Fulano estará no Rio de Janeiro para o Natal” não pode ser avaliada nesse momento, então ela não deve receber um valor verdadeiro ou falso, mas a nova valência “Indeterminado”.
O filósofo norte americano Charles Peirce (1839-1914) também propôs um sistema trivalente, mas chamou o terceiro estado de Limite entre o verdadeiro e o falso.
Livre arbítrio ou determinismo?
A grande questão era pensar sobre o mundo, ou mundos possíveis, sobre o tempo e sobre como expandir o conhecimento e chegar à verdade. O futuro está escrito? O ser humano é livre para agir e construir a própria história? Ou há um determinismo, seja divino, seja físico mecânico, que já traçou todas as possibilidades? Essas possibilidades existem na realidade? Já existem agora e são inalcançáveis? Ou são construídas continuamente a cada momento, segundo as consequências de nossas ações de acordo com nosso livre arbítrio?
Discreto ou contínuo?
Peirce introduz o conceito de fronteira para tratar estados em que há indefinição.
Imagine um pinguinho de tinta azul no papel.
Tudo bem se você pensou na gaivota.
Perceba, em sua mente, o encontro da tinta com o papel. Olhe para a fronteira entre o azul da tinta e o branco do papel. Se você tiver um instrumento preciso o bastante, poderá aproximar-se cada vez mais dessa fronteira. Escolha um ponto. Esse ponto é azul ou branco? E se aumentarmos o zoom?
Peirce argumenta que no limite o ponto não é azul não branco, pois torna-se impossível individualizar apenas um ponto. temos na verdade uma fronteira contínua.
Pierce assume esse raciocínio para tratar o futuro, considerando-o um continuo de instantes, sobre as quais não faz sentido fazer afirmações. Afirmações sobre verdadeiro ou falso só fazem sentido se pudermos identificar exatamente o sujeito a que estamos atribuindo algum predicado. O verdadeiro e o falso se aplicam, portanto, à itens discretos.
Posteriormente Łukasiewicz expandiu sua lógica para valores infinitos entre zero e um, criando uma lógica que pode ser chamada infinitovalente. Sua aplicação prática é permitir, por exemplo, uma análise probabilística de uma afirmação: “Fulano estará no Rio de Janeiro no Natal” tem probabilidade de 85% de ser verdadeira.
Como você encara seu futuro? Ele está escrito? Que tipos de afirmações constuma fazer?
Pensar. E pensar sobre o pensar. Isso nos faz humanos.
Referências
Tempo, modalidade e lógica trivalente em Peirce e Lukasiewcz